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O Roubo Sonoro, ou Pirataria do Áudio como Prerrogativa de Composição

de John Oswald

colagem Felipe Ribeiro

 

Instrumentos musicais produzem sons. Compositores produzem músicas. Instrumentos musicais reproduzem músicas. Gravadores de fita, rádios, toca-discos, etc., reproduzem sons. Um aparelho como uma caixinha de música produz sons e reproduz música. Um fonógrafo nas mãos de um artista de hip hop/scratch que toca um disco como uma tábua eletrônica de lavar roupa, tendo uma agulha fonográfica como palheta, produz sons que são únicos e não reproduzidos – a vitrola torna-se um instrumento musical. Um samplerNT1, em essência um instrumento de gravação e de transformação, é simultaneamente um aparelho de documentação e um aparelho criativo, reduzindo efetivamente uma distinção manifestada pelos direitos autoraisNT2.

NT1 Equipamento capaz de armazenar sons (samples) em uma memória digital, e de reproduzi-los posteriormente (separadamente ou em grupos).

NT2 Copyright.

Amostras gratuitas

Esses modernos e tão falados aparelhos de sampling sonoro digital são, conforme nos foi dito, imitações musicais por excelência, capazes de reproduzir todo o arranjo de orquestra, além de tudo o que grunhe, ou que chia. O substantivo “sample”NT3 é, em nossa cultura comercial, frequentemente precedido pelo adjetivo “livre”, e se alguém pretende predicar esse sujeito, talvez se escute pensamentos em voz alta sobre aquilo que não é uma apropriação auditiva admissível.

NT3 Em português: “amostra”.

Alguns de vocês, atuais e potenciais criadores de samplers, podem estar curiosos quanto à extensão dentro da qual é possível apropriar-se legalmente de ingredientes das manifestações sônicas de outras pessoas. Uma propriedade musical é precisamente privada e, caso seja, quando e como alguém a transgride? Como eu mesmo, você pode cobiçar algo semelhante a um acorde específico, tocado e gravado excepcionalmente bem pelas cordas da estimável Eastman Rochester Orchestra no (há muito) deletado LP Mercury Living Presence da Sinfonia #31 de Charles Ives, em si mesma desenfreada em obtenções não autorizadas. Ou imagine o quão revigorante alguns cantos retrógrados de pigmeus (sem a intenção de difamar o primitivismo) soariam na seção quase-funk do seu emulador. Ou, porventura, você simplesmente gostaria de transferir uma oitava de soluços da biblioteca sonora de um Mirage para as catapultas de fita forçadas por ação de mola do seu Melotron2.

Materiais sonoros que inspiram composições podem eventualmente ser considerados, eles mesmos, composições? O piano é a criação musical de Bartolommeo Cristofori (1655-1731), ou meramente o veículo criado por ele para que Ludwig Van e outros o manobrassem em seus territórios musicais? Algumas composições memoráveis foram criadas especificamente para o gravador digital daquela época, a caixinha de música. Os sons predefinidos de sequenciadores e de sintetizadores atuais são amostras gratuitas, ou são propriedade musical de um fabricante3? É mais difícil definir a posse de um timbre do que a posse de uma melodia? Um compositor que alega receber inspiração divina talvez esteja isento de responsabilidade em relação a esse inventário de camadas de autoria. Mas e os menos abençoados de nós?

Vejamos o que os poderes em vigor têm a dizer. ‘Autor’ é o termo de direitos autorais para qualquer progenitor criativo, não importa se o mesmo programa softwares ou se compõe da maneira padrão. A saber: “Um autor tem o direito de reivindicar autoria e de preservar a integridade do trabalho, restringindo qualquer distorção, mutilação, ou outra modificação que seja prejudicial à honra ou à reputação do autor”. Isso se chama ‘direito de integridade’, e foi extraído do Ato Canadense de Direitos Autorais4. Um relatório recém-publicado sobre a proposta de revisão do Ato utiliza a metáfora dos direitos dos proprietários de terras, em que o uso não autorizado é sinônimo de violação.

O território é limitado. Apenas recentemente, as gravações sonoras foram consideradas parte dessa propriedade.

A fita em branco é derivada, nada em si mesma

Lá em 1976, dezenove anos depois da entrada de Edison no mercado fonográfico, o Ato de Direitos Autorais dos Estados Unidos foi revisado para proteger gravações sonoras naquele país pela primeira vez. Antes disso, apenas músicas escritas eram consideradas elegíveis para proteção. Formas de música que não eram inteligíveis ao olho humano eram consideradas inelegíveis. A postura tradicional era a de que gravações não eram criações artísticas, “mas meras utilizações ou aplicações de trabalhos artísticos na forma de objetos físicos”5.

Algumas organizações dedicadas à música ainda mantêm esta ‘visão’. O atual Ato Canadense teve origem em 1924, muito tempo após o Ato dos Estados Unidos de 1909, e até aqui “o direito autoral existe em discos, rolos perfurados, e em outros dispositivos através dos quais sons podem ser reproduzidos mecanicamente”.

Evidentemente, a funcionalidade de dispositivos mecânicos é, atualmente, mais diversa do que qualquer pessoa poderia ter previsto na virada do século, mas agora o verdadeiro pesadelo para aqueles que escrevem direitos autorais são os novos dispositivos eletrônicos, incluindo samplers digitais de sons e seus primos, os computadores. Entre “as secreções culturais íntimas da mídia comunicativa eletrônica, biológica e escrita”6, o mercado de cérebros eletrônicos está sendo cultivado, pela graça de sua relativa juventude, de sua criatividade pioneira, e de uma ingenuidade conivente correspondente. O fascínio popular pelo roubo por intermédio de computadores inspirou suspenses do cinema e da literatura, enquanto o roubo da música é restrito à caça elementar e a uma inocência descuidada. Os enredos são triviais: Disney acusa Sony de conspirar com consumidores para produzir camundongos não autorizados . O ex-Beatle7 George Harrison foi declarado culpado de indiscrição por escolher uma sequência vagamente familiar de tons8.

A controvérsia de fazer-cópias-na-privacidade-de-seu-próprio-lar é, na verdade, a ponta de um grande iceberg de criatividade rudimentar. Após serem, por décadas, os receptores passivos de música empacotada, os ouvintes agora possuem meios para agregar suas próprias escolhas, para separar prazeres de preenchimento. Eles estão reproduzindo uma variedade de sons de todo os cantos do mundo, ou ao menos dentro do escopo de suas coleções de discos, fazendo compilações com uma diversidade indisponível na indústria musical, com seus estábulos circunscritos de artistas, e uma política ainda mais dominante que prevê apenas suprir o denominador comum.

O caso dos Chiffons/Harrison, e a responsabilidade geral da originalidade melódica, indicam uma preocupação contínua que equivale à briga pela patente do cilindro de Edison.

O Comércio do Ruído

A precariedade da música como bem de consumo nos dias atuais não é mais o assunto. Um fã pode reconhecer um sucesso em um estouro de dez milissegundos9, mais rápido do que um FairlightNT4 pode assobiar Dixie. Notas, com seus valores de ritmo e de tom, são componentes triviais na harmonização corporativa da cacofonia. Poucos músicos pop conseguem ler músicas com facilidade. A Art of NoiseNT5, uma firma de gravação baseada voltada ao mercado de massa, encadeia arranjos atonais de timbres na linha de uma batida ubíqua. O Emulador preenche os requisitos. Cantores que trabalham com material original não estão estudando os contornos melódicos de Bruce Springsteen, eles estão tentando soar exatamente como ele. E a personificação sônica está completamente de acordo com a legalidade. Enquanto organizações de direitos performáticos continuam buscando avanços para intérpretes e para poetas, aqueles que estão dando forma à maneira que a oposição diz que a música deveria ser, ritmistas, especialistas em timbres e em mixagem, sob vários nomes, raramente receberam créditos de composição10.

NT4 O primeiro sampler digital.

NT5 Em português: “Arte do Ruído”.

No que alguns gostariam de considerar o lado oposto do campo, entre acadêmicos e técnicos assalariados dos enxames orquestrais, uma exposição ordenada de fermatas e de semifusas em uma página ainda é frequentemente considerada indispensável para a definição de uma música, mesmo que alguns compositores sérios raramente lidem com isso, se é que ainda o fazem. Evidentemente, caso aparências sejam necessárias, um programa de computador e uma impressora podem fazer isso por eles.

A linguagem musical tem um extenso repertório de esquemas de pontuação, mas nada equivale às aspas “ ” da literatura. Músicos de jazz não agitam dois dedos de cada mão no ar, como é feito com frequência por conferencistas, quando utilizam referências durante seus improvisos, dado que, na maioria dos instrumentos, isso representaria algumas dificuldades técnicas – trompetes caindo, e daí em diante.

Sem um sistema de citações, não se pode distinguir semelhanças bem-intencionadas de plágio e de fraude. Mas de qualquer modo, a citação de notas é uma porção pequena e insignificante da apropriação comum.

Será que estou subestimando o valor da composição melódica? Bem, espero que em breve exista um software de escrita musical funcional em termos de mercado, capaz de gerar banalidades de cativantes permutações da escala diatônica em arranjos infinitos de tons harmônicos, dentre os quais um compositor não necessariamente afluente poderia escolher; talvez dispondo de um dicionário embutido para checagem de melodias já utilizadas, recomendaria ao Beatle George11 que não cometesse o mesmo erro novamente.

Quimeras sonoras

Alguns compositores consideraram, por muito tempo, o gravador de fitas como um instrumento musical capaz de cumprir mais do que a função de transcrever em alta fidelidade, papel a que fabricantes tradicionalmente limitaram sua funcionalidade. Agora existem híbridos da prole eletrônica dos instrumentos acústicos e de mimetismos auditivos pelos clones digitais dos gravadores de fitas. Mimetismo auditivo por meios digitais significa que nada é novo; manticoras mecânicas do século 19 com nomes como Violano-virtuoso e Oschestrion são singularmente semelhantes ao Sistema Musical Digital Synclavier e ao Fairlight IMC (instrumento musical computadorizado). No caso do Synclavier, que é promovido como um estúdio de gravação de combinação multipistas e de orquestra sinfônica simulada, assemelha-se a um piano com um teclado de acordeão e com um rádio-relógio LED.

O compositor que arranca uma folha de grama e, com as mãos contra os lábios, cria uma membrana vibrante que produz som e ressonância, embora esteja sujeito a comentários como “isso já foi feito”, está em posição potencial para se desviar de conquistas tecnológicas anteriores, e para se comunicar diretamente com a natureza. Da música de ferramentas, mesmo os implementos iconoclastas de um Harry Partch ou de um Hugh LeCaine estão sujeitos à convenção da distinção entre instrumento e composição. Utensílios sonoros, do erh-hu ao Emulador, têm oferecido, tradicionalmente, tamanho potencial para manifestações variadas, que os mesmos não têm sido considerados manifestações musicais em si mesmos. Isso segue em oposição à grande popularidade da música instrumental genérica (“The Many Moods of 101 Strings”, “Piano for Lovers”, “The Truckers DX-7”, etc.), sem mencionar instrumentos que tocam a si mesmos, sendo as caixas rítmicas pré-programadas o exemplo mais penetrante nos últimos anos. Tais dispositivos, encontrados em ambientes lounge e nos consoles centrais de órgãos, são parentes da jukebox: basta apertar um botão para se ouvir música. J.S. Bach comentou que, com qualquer instrumento, “tudo o que precisa ser feito é atingir as notas corretas no momento correto, e o objeto toca a si mesmo”. A distinção entre produtores musicais e reprodutores de músicas é facilmente confundida, e tem sido uma área concebível de busca musical pelo menos desde o uso de rádios por John Cage nos anos 40.

Começando do zero

Assim como tecnologias de produção musical e de reprodução musical têm se tornado mais interativas, ouvintes têm infringido novamente, quando não convidados, território criativo. Esta prerrogativa tem sido amplamente esquecida nas últimas décadas. A geração atualmente primitiva de toca-discos foi uma porção passiva (a forma ativa de scratch pertence à era pós-disco, boombox/Walkman). Foram-se os dias de execuções ao vivo ao piano.

Computadores podem retirar a técnica da composição musical amadora. Um atual programa da music-minus-oneNT6 retarda tempos musicais e procura acordes onipresentes para apoiar os delírios de músicos novatos. Alguns equipamentos de áudio feitos para o consumidor oferecem inadvertidamente possibilidades interativas. Entretanto, fabricantes têm desencorajado a compatibilidade entre equipamentos de áudio profissional e de áudio amador. A passividade ainda é a estatística dominante. Prova disso são as entradas de microfones, que praticamente desapareceram de equipamentos de reprodução de som12.

NT6 Music Minus One: empresa especializada em produção de partituras.

Como um ouvinte, afirmo que a preferência é a opção de experimentar. Meu sistema de som é equipado com um mixer ao invés de um receptor, com uma mesa que possibilita infinitas variações de velocidade, com filtros, com capacidade reversa, e com um par de orelhas.

Um ouvinte ativo pode acelerar uma música para perceber mais claramente sua macroestrutura, ou pode reduzir sua velocidade para escutar articulações e detalhes com mais precisão. Porções de obras são justapostas para comparação, ou mesmo tocadas simultaneamente, traçando “os ritmos predominantes na música clássica indiana sobre uma gravação parisiense de batidas senegalenses e, como pano de fundo, um mosaico de momentos congelados de uma exótica orquestração Hollywoodiana dos anos 50 (uma textura sônica como uma “Mona Lisa” que, quando vista em close, revela ser feita de pequenas reproduções do Taj Mahal)”13.

Durante a 2ª Guerra Mundial, que coincidiu com o restabelecimento, por parte de Cage, da condição de percussão do piano, a população de Trinidad e Tobago descobriu que barris de petróleo que haviam sido descartados poderiam ser alternativas baratas para seus tradicionais instrumentos de percussão, banidos em função de seu potencial de revigoramento social. O tambor de aço tornou-se, eventualmente, um bem nacional. Enquanto isso, nos Estados Unidos, por razões talvez semelhantes, scratch e dub foram inseridos, nos anos 80, nos guetos negros norte-americanos. Em meio a um repertório de posses limitado, imposto pelo ambiente, um disco portátil pode ter um potencial em música folclórica maior do que o da guitarra. Eletrônicos penhorados e roubados não costumam acompanhar manuais de usuário com avisos ao consumidor como “este boombox é um reprodutor passivo”. Qualquer potencial de performance em um aparelho costuma ser explorado. Um disco pode ser tocado como uma tábua eletrônica de lavar roupa. DJs em rádios e discotecas tocam, simultaneamente, camadas sonoras de inúmeras gravações14. O som musical transmitido com uma nova autoridade pelas ondas do ar é copiado, adornado e manipulado.

O meio é magnético

Pirataria ou plágio de um trabalho ocorre, de acordo com Milton, “quando este não é melhorado por aquele que tomou empréstimo”. Stravinsky acrescentou o direito de posse à distinção feita por Milton, quando disse: “Um bom compositor não imita; ele rouba”. Um exemplo desse empréstimo melhorado é “Collage 1” (1961), de Jim Tenney, em que o sucesso “Blue Suede Shoes” (esse mesmo, apropriado de Carl Perkins), de Elvis Presley, é transformado por gravadores de múltipla velocidade e por cortes. Da mesma maneira, Pierre Schaeffer encontrou potencial musical em seu objeto sonoro, que poderia ser, por exemplo, um passo, e com muitas associações, Tenney selecionou uma música cotidiana e nos permitiu que a ouvíssemos de outro modo. Ao mesmo tempo, tudo aquilo inerente a Elvis influenciou nossa percepção da obra de Jim.

Fair use e fair dealingNT7 são, respectivamente, os termos norte-americanos e canadenses para instâncias nas quais a apropriação sem permissão pode ser considerada legal. Citar trechos de músicas para fins pedagógicos, ilustrativos e críticos é considerado, legalmente, como fair use. O mesmo ocorre com a apropriação para fins de paródia. O fair dealing leva em consideração o uso que não interfere com a viabilidade econômica do trabalho inicial.

NT7 Em português: “uso justo”.

Além dos direitos econômicos, direitos morais existem no escopo dos direitos autorais e, no Canadá, esses estão recebendo maior ênfase nas recomendações atuais de revisão. Um artista pode reivindicar determinado direito moral a um trabalho. O espólio de Elvis pode reivindicar os mesmos direitos, incluindo o direito à privacidade, e o direito à proteção do “significado especial de sons particulares a um determinado artista”, cuja singularidade pode ser prejudicada por gravações não autorizadas inferiores, que podem vir a confundir o público a respeito das habilidades de um artista.

Atualmente, no Canadá, um trabalho pode servir como uma matriz para derivações independentes. A Seção 17(2)(b) do Ato Canadense de Direitos Autorais estabelece “que um artista que não detém direito autoral de uma obra pode utilizar certos materiais usados para produzir aquela peça na criação de uma obra subsequente, sem que esteja infringindo direitos de autoria da peça anterior, caso o trabalho subsequente, tomado como um todo, não repita a estrutura principal da obra prévia”.

Minha observação é que “Blue Suede”, de Tenney, satisfaz as condições de Milton; é apoiada pelo aforismo de Stravinsky; e não questiona a integridade de Elvis ou a Seção 17(2)(b) do Ato de Direitos Autorais.

Selva auricular

A reutilização de gravações existentes não está restrita às ruas e ao esoterismo. O acorde de guitarra que ocorre raras vezes em “Rocket”, arranjo de sucesso de H. Hancock, não foi atingido por um guitarrista filiado a um sindicato, mas foi sampleado diretamente de um antigo disco do Led Zeppelin. De modo semelhante, Michael Jackson surge inadvertidamente no clone seguinte de Hancock, “Hard Rock”. Uma vez que tecladistas estão adquirindo instrumentos com um botão embutido para realizar esse tipo de apropriação, eles vão apertá-lo, o que é mais simples do que reconstruir o som ideal da primeira oscilação. Tais músicos estão acostumados a replicar na ponta dos dedos, como no caso do órgão que tinha, impresso em suas teclas, os títulos das canções das quais os timbres foram derivados15.

Então, o equipamento está disponível, e todos o estão utilizando, descaradamente ou não. Invenções melódicas não são dignas de noites em claro (pense no que o sono fez com Tartini). Há uma determinada margem legal para imitações. Podemos, como Charles Ives, nos apropriarmos alegremente e descaradamente de todas as músicas que estão circulando?

Ives compunha em uma época em que muitas canções existiam em domínio público. O domínio público tem, atualmente, definição legal, embora a distância que mantém do presente varie de país a país. Para seguir o modelo de Ives, estaríamos restritos a utilizar as mesmas velhas canções que, em seu tempo, eram atuais. Contudo, canções de domínio público podem se tornar muito populares, talvez porque o compositor não tenha mais direito a exclusividade, ou ao pagamento de royalties, por uma canção. Ou como diz This Business of MusicNT8, “O domínio público é como um incomensurável parque nacional sem um guarda para impedir roubos desenfreados, sem um guia para os viajantes perdidos, e de fato, sem estradas claramente definidas ou mesmo fronteiras para impedir que visitantes desamparados sejam processados por intrusão pelos donos de propriedades adjacentes”.

NT8 “This Business of Music: The Definitive Guide to the Music Industry”, livro de M. William Krasilovsky.

Fomentadores profissionais do panorama musical conhecem e fazem lobby pelas fendas nos direitos autorais. Por outro lado, muitos empreendimentos artísticos se beneficiariam criativamente de um estado musical sem cercas, mas no qual, como uma bolsa de estudos, se insistisse pelo reconhecimento.

O zumbido de uma abelha titânica16

É difícil perseguir a metáfora de propriedade utilizada para ilustrar os direitos de um artista através de publicações e de disseminação em massa. As paradas de sucesso passeiam pelas balsas auriculares do pop em exibição pública, e como turistas curiosos, não deveríamos poder tirar nossas próprias fotografias em meio à multidão (“pequenas reproduções do Taj Mahal”), ao invés de estarmos limitados a adquirir cartões-portais e impressos como recordação?

Toda a música popular (e toda a música folclórica, por definição), existe essencialmente, se não legalmente, em um domínio público. Ouvir música pop não é uma questão de escolha. Optando ou não, somos bombardeados por esse tipo de música. Em seu estado mais pérfido, filtrado a uma incessante linha de baixo, penetra através de paredes de apartamentos e sai das cabeças das pessoas. Embora indivíduos em geral estejam produzindo mais ruídos do que antes, poucos estão gerando mais que o ruído total; especificamente, na música, aqueles amplificadores imensos, discos de platina tripla, e rotação pesada. Difícil de ignorar, redundantemente sem sentido imitar, como alguém não se torna um recipiente passivo?

Ao propor seu plano de apreender o Titanic quando o mesmo fosse localizado no fundo do Atlântico, o oceanógrafo Bob Ballard, do Laboratório de Emergências das Profundezas, sugeriu “você o esmurra pra diabos, com todos os sistemas de imagem que você tiver”.

Conforme apresentado por John Oswald à Wired Society Electro-Acoustic Conference (Conferência Eletroacústica da Sociedade “Plugada”) em Toronto, no ano de 1985.

 

1 Mercury SR90149. A questão da acessibilidade do usuário (em oposição ao ouvinte) à gravação é um pouco complicada, e a resposta varia de país a país. Gravações executadas antes de 1972 não estão protegidas por direitos autorais federais nos Estados Unidos, mas em alguns casos, estão protegidas pelas leis comuns e por estatutos antipirataria. A Sinfonia #3 foi publicada e protegida por copyright em 1974 pela Arrow Music Press. O fato de os direitos terem sido designados à editora ao invés dos compositores foi o resultado do desdém de Ives pelos direitos autorais relativos ao seu próprio trabalho, e do desejo de que sua música fosse distribuída amplamente. Primeiramente, ele mesmo publicou e distribuiu seu trabalho sem custos. No pós-escrito de “114 Songs” (“114 Canções”), ele se refere ao proprietário como “o sujeito delicado que toma emprestado”. Algum tempo após essas ofertas, Ives permitiu a publicação de sua obra no periódico New Music, com a condição de que ele cobrisse todos os custos.

 

Parece que Ives foi levado à fúria ao descobrir que, de acordo com o costume, a New Music havia registrado copyright em nome do compositor para o trecho de sua Quarta Sinfonia, que havia sido publicado pelo periódico. Ives andou para cima e para baixo, com a face vermelha, enquanto agitava sua bengala ao ar: “Todos que querem uma cópia devem recebê-la! Se alguém quiser copiar ou reeditar essas peças, tudo bem! Essas músicas não servem para fazer dinheiro, e sim para serem conhecidas e ouvidas. Por que eu deveria interferir com sua existência, detendo direitos legais pessoais?” (Retirado de “Charles Ives and His Music”, por Henry e Sidney Cowell [Oxford University Press, 1955], pp. 121-2.) Anos depois, Ives não permitiu a publicação comercial, mas sempre designou royalties a outros compositores.

 

Ives admirava a filosofia de Ralph Waldo Emerson, que no artigo “Quotation and Originality” (“Citação e Originalidade”) disse, “Um homem não se apoiará em sua invenção quando sua memória oferecer uma palavra de igual eficácia; e, o que você deve a mim – você modificará a frase, mas ainda reconhecerei meu pensamento. Mas o que você diz a respeito da mesma idéia, também terá, para mim, o esperado efeito inesperado que pertence a todos os novos trabalhos”.

 

 

 

2 As palavras Emulador e Mirage descrevem com precisão as máquinas que possuem esses nomes. Window Records é a alcunha mais ambígua para um dispositivo que pode armazenar mais programas do que a maioria dos samplers, e portanto, intermedia o sentido dos termos sampler e gravador digital. Na outra ponta estão as unidades de delay digital, efetivamente samplers de curto prazo.

 

 

 

3 As seguintes citações são trechos de um painel que ocorreu em janeiro de 1986, envolvendo a PAN, um fórum de discussão de músicos. Hensley: a opinião de profissionais do ramo legal era a de que, uma vez que o hardware servia para limitar o número de sons possíveis, e porque não era apenas possível, mas provável, que dois indivíduos pudessem programar separadamente sons idênticos… Em função de tudo isso, patches para sintetizadores não caíram no domínio de materiais que poderiam proteger efetivamente direitos autorais.

 

  1. Hodge: Se todos estão utilizando sons específicos (e se já o fizeram), então o quão bom é esse som? (Bem, isso não o tornaria ruim, mas perderia seu impacto).

 

SPBSP: Que bem faz um ótimo som se o mesmo estiver disponível para as “massas”? Bem… Quão bom é um Hammond B-3, uma Stratocaster, uma Fender Rhodes, ou um Stradivarius? Grandes instrumentistas e programadores oferecem sons gratuitamente, talvez confiantes de que não se trata do tamanho, e sim do movimento. Dave sobre Teclado: Não acho que um som deveria ser analisado nos mesmos termos que um livro, ou que uma composição musical. Excelentes trabalhos em quaisquer campos seriam bastante desvalorizados caso se alterasse uma palavra, se retirasse uma nota, ou se refizesse um anexo. Um som é mais subjetivo, como uma receita.

 

Bill Monk: Minha perspectiva é de que, enquanto um patch é passível de proteção autoral (melodias o são, ainda que produzidas com um número muito menor de parâmetros), isso realmente não importa. Os interessados em “roubar” patches provavelmente não têm a capacidade de fazer seus próprios, ou de alterar o material roubado de modo significativo. Mas eu posso criar muitos outros em pouco tempo e com pouco esforço. O que importa é a habilidade contínua, e não apenas ter alguns ótimos patches.

 

  1. Fischer: Atualmente, ainda não é claro se “sons” são passíveis de proteção autoral, mas é possível elaborar uma forte causa solicitando que os mesmos sejam protegidos. A decisão jurídica mais próxima envolveu o jogo de hockey Chexx (sons de vaias e de torcida). A causa resultou na proteção dos sons como gravações sonoras. Southworth: Muitos programadores de DX-7 disseram-me “esconder” dados inúteis em seus sons, para que, no futuro, pudessem provar sua posse. Às vezes, os dados são óbvios, como escalas de teclado ou operações inaudíveis, e às vezes não o são, como caracteres sem sentido (acho que lembro de alguém ter pensado que se tratava de escrita Kanji) no nome de um programa. Evidentemente, qualquer pirata que se valha encontraria esses itens, e os alteraria… Programadores de synth são verdadeiros peritos, como o são aqueles que constroem violinos, então caso eles se dêem ao trabalho de criar novos e maravilhosos sons que possam ser utilizados por outras pessoas, eles devem ter seus esforços recompensados. Infelizmente, isso não é tão simples quanto vender um maldito violino.

 

Também encontrei a seguinte citação na Sweetwater, uma comunidade de trocas dedicada ao sampler Kurzweill (amplamente promovido como um ótimo imitador do piano): “Fizemos cross-sampling da maior parte da biblioteca do Emulator II (nada é sagrado…” E também há a citação de um texto promocional da Digidesign para o Sound Designer (software de apoio ao Emulator): “O ‘lápis’ do Sound Designer permite que você desenhe ondas senoidais do zero, e que corrija sons sampleados. Quer trabalhar com um som sampleado de um disco? Simplesmente desenhe a onda senoidal…”

 

O disco de quem? Samples são gravações e, em teoria, são protegidas como tal. Mas como diz o correspondente da PAN Bill Monk, ser capaz de provar propriedade, e efetivamente ir ao tribunal, são duas coisas diferentes.

 

 

 

4 “A Charter of Rights For Creators, Report of the Subcommittee on Revision of Copyright” (“Um Título de Direitos para Criadores, Relatório do Subcomitê da Revisão dos Direitos Autorais”). Este é o mais recente dentre dezesseis estudos publicados pelo governo canadense antecipadamente à revisão do Ato de Direitos Autorais do Canadá. Segue “De Gutenberg a Telidon”, o manifesto final do governo que esteve no poder anteriormente. As seguintes citações foram retiradas de “Um Título de Direitos para Criadores”:

 

Há mais em jogo na exploração de uma obra do que a compensação econômica. Trabalhos criativos são a expressão da personalidade de seus autores. Há uma identificação entre autores e suas criações. O Subcomitê concorda com as várias testemunhas que declararam que criadores não podem estar plenamente protegidos, a não ser que seus direitos morais sejam reconhecidos e aprimorados.

 

Outra consequência da linguagem utilizada no Ato atual é que direitos morais parecem estar protegidos apenas durante a vida do autor, ao invés do período usual que engloba a vida do autor e mais cinquenta anos. Se os direitos morais serão reconhecidos com a mesma importância dos direitos econômicos, o termo de proteção deveria ser o mesmo. (P. 6.) Testemunhas que se apresentaram perante o Subcomitê também apoiaram a recomendação, presente em “De Gutenberg a Telidon”, que estabelece: a modificação autorizada do original de uma obra artística deveria ser uma infração do direito de integridade moral, ainda que na ausência de provas de lesão à honra e reputação do artista. O Subcomitê concorda que esta recomendação deveria ser adotada com suas limitações referentes à realocação física, alteração da estrutura que contém a obra, e atividade de restauração legítima e preservação.

 

O Subcomitê gostaria de esclarecer, entretanto, que o respeito às obras intelectuais e a seus criadores não deve tomar a forma de paternalismo. A criação é, afinal, uma das buscas mais assertivas que se pode imaginar, precisamente porque é um processo provido de consideráveis riscos. Artistas e outros criadores sempre terão que se engajar em uma batalha na qual muitos falham, e que não garante sucesso. (P. 7.)

 

 

 

5 Dentre as inúmeras obras cobertas pelo Ato de Direitos Autorais, apenas uma – o trabalho musical – é especificamente definida. Todas as demais são descritas por intermédio de exemplos – um método de minuta legal que oferece escopo para a flexibilidade, caso as circunstâncias sofram alteração. Como obras musicais são definidas como “combinações de melodia e de harmonia, ou de nenhuma das duas, que foram editadas, reduzidas à escrita ou, diferentemente, graficamente produzidas ou reproduzidas”, uma farta fatia da música contemporânea não pode ser protegida por copyright porque a mesma nunca foi escrita: é chegado o momento para que a lei oriente o critério determinante para a música com a mesma flexibilidade que o faz para outros trabalhos. É um fato relevante que produções musicais tenham como critério gravações, em oposição à partitura escrita. Uma lei revisada desta maneira seria consistente em tratar, na medida do possível, todos os temas da mesma forma. (Pp. 30-31.)

 

A presente lei compara gravações sonoras a obras musicais, literárias, ou dramáticas. Esta categorização é ultrapassada. É chegado o momento de proteger gravações sonoras como uma categoria exclusiva. Além disso, a lei deveria especificar que a proteção de gravações sonoras é totalmente independente daquilo que é gravado. É uma questão relevante compreender se o que é gravado é uma obra protegida por copyright, ou se consta em domínio público. Por exemplo, sons de pássaros não constituem material protegido por copyright, uma vez que tais sons não são obras. Mas uma gravação sonora dos mesmos sons de pássaros seria protegida dentro da nova categoria sugerida nesta recomendação. (P. 49.)

 

(Referências ao Ato de Direitos Autorais dos Estados Unidos foram retiradas de “This Business of Music”, de Shermel e de Krasilovsky – Billboard Publications, 1979 – e de “A Treatise on the Wages of Sinning for Sound”, de Tom Schulteiss).

 

 

 

6 Esta é a pungente frase de Chris Cutler, publicada em “File Under Popular” (November Books, 1985), que também inclui uma boa análise de tentativas de definição da música popular, e uma definição de música folclórica integrante ao uso desse termo em “Plunderphonics”:

 

Primeiramente, seu meio de geração musical e de perpetuação é a tradição, baseada em memória humana, que também é biológica. Este modo é centralizado no ouvido, e apenas pode existir em duas formas: como som e como memória sonora.

 

Em segundo lugar, a prática musical é, em todos os casos, um atributo expressivo de toda uma comunidade, que se adapta e muda de acordo com as preocupações e com as realidades que expressa – ou como o vocabulário de uma coletividade estética – adaptam-se e mudam. Não há pressão externa sobre a prática musical.

 

Em terceiro lugar, não existe algo como uma obra musical finalizada ou definitiva. No máximo, pode-se dizer que há “matrizes” ou “campos”. Consequentemente, não existe elemento de propriedade pessoal, embora haja, é claro, contribuição individual (“File Under Popular”, pp. 133-4.)

 

 

 

7 A decisão da Nona Corte de Apelos dos Estados Unidos no que ficou conhecido como o “caso Betamax”, um processo feito pelas Walt Disney e Universal Studios contra a Sony. Foi decidido que gravar conteúdo exibido na TV significava uma quebra da lei. Curiosamente, a indústria fonográfica nunca abriu um processo semelhante contra os fabricantes de gravadores de áudio. “Parasitário e predatório”, disse Stanly Gortikov, Presidente da Associação da Indústria Fonográfica dos Estados, a respeito da indústria das fitas virgens. “A gravação caseira é uma explosão. Os estilhaços dessa explosão drenam a vida da comunidade musical… Enfraquece as gravadoras, cujo trabalho tornou-se um meio mundial de comunicação”.

 

O título de nossa seção “A fita em branco é derivada, nada em si mesma” é de autoria de David Horowitz, da Warner Communications (extraído de “The War Against Home Taping” – “A Guerra Contra a Gravação Caseira”, da revista Rolling Stone, 16 de setembro de 1982, p. 62).

 

 

 

8 George Harrison foi considerado culpado de plagiar subconscientemente a canção de 1962 “He’s So Fine”, de autoria dos Chiffons, em sua música “My Sweet Lord” (1970).

 

Em seu texto especulativo “Melancholy Elephants” (“Elefantes da Melancolia”, Penguin Books, 1984), Spider Robinson descreveu prós e contras do copyright rigoroso. O cenário é a meio século daqui. A população cresceu dramaticamente, e há muitos com mais de 120 anos. Existem muitos compositores. A história é centralizada na oposição de uma personagem a um projeto de lei que prolongaria direitos autorais à perpetuidade. No futuro de Robinson, compor já é difícil, uma vez que muitos trabalhos estão sendo considerados derivados pelo escritório de direitos autorais. O caso Harrison é citado como um importante precedente. Então, ao fim dos anos 80, a grande Praga do Plágio é realmente incitada nos tribunais, e daí em diante instaura-se a temporada de caça aos compositores populares. Mas a crise realmente eclode na virada do século, quando “Ringsong” de Brindle é considerada “substancialmente semelhante” a um dos concertos de Corelli.

 

Robinson comenta que o sistema de composição que prevalece atualmente tem um número limitado de notas especificáveis, que podem ser combinadas em um grande, mas finito número de maneiras:

 

Artistas têm se iludido por séculos com a noção de que eles criam. Na verdade, eles não fazem nada disso. Eles descobrem. Inerente à natureza da realidade está um número de combinações de tons musicais que será compreendido como agradável pelo sistema nervoso central humano. Por mil anos, as temos descoberto, implícitas no universo – e dizendo a nós mesmos que as “criamos”. Criar implica possibilidades infinitas. Como uma espécie, creio que reagiremos negativamente ao nos depararmos com o fato de que somos descobridores, e não criadores. (P. 16.)

 

 

 

9 A estimativa de dez milissegundos não é baseada em qualquer pesquisa psicofisiológica da qual eu tenha conhecimento, mas é uma duração próxima do limiar mais veloz da percepção musical, a que se aproximam os exemplos dados nos concursos de reconhecimento de faixas da parada de sucessos.

 

 

 

10 Ao contrário dos veículos mais tradicionais de expressão criativa, tais como escrita, teatro, ou arte, as novas mídias do século 20 – álbuns, filmes, transmissões, computadores – muitas vezes demandam mais equipamentos e um time criativo maior e mais diversificado. A criação não é mais uma arte, e sim uma indústria. Esta mudança não apenas envolve novas formas de organização econômica, como também alcança o próprio processo criativo. Por exemplo, em uma gravação sonora, os aspectos criativos incluem a escolhe de obras, a contribuição de músicos e de cantores, o trabalho de mixagem, e daí em diante. Aqui, a contribuição de cada membro de um time é distinta, mas inseparável do produto final; o resultado é maior que a doma das partes (Um Título de Direitos para Criadores, p. 13.).

 

 

 

11 Os Beatles, especialmente Harrison, são um caso interessante de reciprocidade entre fair use e o acúmulo de posses e de riqueza. “Nós somos os maiores ladrões da cidade, extraordinários plagiadores”, afirmou Paul McCartney (“Musician”, Fevereiro de 1985, p. 62). Ele possui um dos catálogos musicais mais extensos do mundo, que inclui alguns hinos nacionais. John Lennon incorporou técnicas de colagem em canções como “Revolution 9”, que contém dúzias de fragmentos não autorizados em loop, gravados a partir de transmissões de rádio e de televisão. George obviamente não plagiou “subconscientemente” no caso de seu álbum “Electronic Sound”. Este lançamento consistiu em nada mais que a fita de uma demonstração eletrônica que o músico Bernie Krause havia oferecido a Harrison no então-novo sintetizador Moog.

 

Krause: “Perguntei a ele se ele achava justo não ter me oferecido a divisão nos créditos do disco e nos royalties. Sua resposta foi que eu confiasse nele, que eu não deveria agir como o Marlon Brando, que o nome de George Harrison no álbum faria bem a minha carreira, e que, caso o álbum vendesse bem, ele me daria ‘uma graninha’”. O disco foi lançado com o nome de George em letras garrafais, enquanto o nome de Krause permaneceu obscuro.

 

 

 

12 O botão PAUSE nos gravadores de fitas caseiros é utilizado para edição e para colagem em tempo real, i.e., edição seletiva em tempo real. Isso levou a um conhecimento do comportamento do PAUSE em vários sistemas de som. Cada um é responsável por uma edição sonora diferente. Alguns podem ser operados mais rapidamente e precisamente que outros. Vários compositores preferem a linha Sony TC 153-158, há muito descontinuada, do que outras opções.

 

A saga dos gravadores digitais destinados ao consumidor da Sony é um interessante caso de manutenção do vão entre produtos de áudio profissional e de áudio amador. O relativamente barato PCM-F1, um sistema portável de conversão digital/analógica foi, provavelmente, adquirido por mais profissionais do que por interessados em gravação caseira. Era essencialmente compatível com, e poderia substituir, equipamento profissional muito mais caro. A Sony descontinuou o F1, substituindo-o pelo 701 E, que não era portátil e não tinha entrada para microfone. Mas ainda podia ser adaptado como um conversor de estúdio profissional. Então a Sony o emasculou, introduzindo o 501 E, semelhante, porém, para a maioria dos fins, incompatível com estúdios.

 

 

 

13 Citação do artigo “Magic Realism” (“Realismo Mágico” de John Hassell. A passagem refere-se de modo evocativo a algumas apropriações e transformações nas gravações de Hassell. Em alguns casos, esse tipo de utilização obscurece a identidade do original e, em outros casos, as fontes são reconhecíveis.

 

 

 

14 Ele “inventou a técnica de ‘slip-cue’: segurar o disco com o dedão enquanto o prato da vitrola girava, isolado por feltro. Ele localizaria, com um fone de ouvido, o melhor ponto para fazer o encaixe, e soltaria o próximo lado precisamente na batida… Seu tour de force era toca dois discos simultaneamente, por até dois minutos a cada vez. Ele reforçaria a interrupção de batidas de ‘I’m a Man’ com os gemidos orgásticos ‘Whole Lotta Love’, do Led Zeppelin, de modo a criar uma poderosa combinação erótica… Aquilo antecipou a fórmula de batidas de baixo e de bateria e de ruídos de amor… Hoje um dos clichês da mixagem”. (Referência ao DJ Francis Grosso no Salvation Club em Nova York em meados dos anos 70, extraída de “Disco” por Albert Goldman. Esta referência também consta no artigo “Behind the Groove”, de Steven Harvey, na publicação “Collusion” #5).

 

 

 

15 Fui incapaz de localizar novamente a referência para este dispositivo que tinha, por exemplo, uma marcação do sucesso “96 Tears”, do grupo ? & the Mysterians. De acordo com uma fonte, pode ter sido uma zombaria exclusiva dos comerciais do sintetizador Juno-60 da Roland.

 

 

 

16 “Uma nota musical é como o zumbido de uma abelha titânica que se acelerou através do espaço” é um cálculo dos sons que usuários de rádio-amador receberam ao longo da costa leste dos Estados Unidos em 1914, um ano após o tumulto de “Rite of Spring” (“O Rito da Primavera”, de Igor Stravinsky).

 

Ninguém sabia o que tais sons significavam até que alguém experimentou gravá-los em um cilindro fonográfico de Edison, que havia sido alterado. Quando ele acidentalmente tocou o disco ao contrário com a máquina, ele notou que, conforme o cilindro girava lentamente, os apitos agudos equivaliam a sinais do código Morse.

 

Investigações revelaram que uma estação de rádio nos Estados Unidos estava transmitindo esses sinais para embarcações alemãs próximas à costa. Uma guerra estava acontecendo naquele momento. A Marinha norte-americana invadiu a estação, e as gravações foram mantidas em segredo até recentemente, quando o Ato de Liberdade de Informação permitiu que o Arquivo Nacional os disponibilizasse.

 

O Ato de Liberdade de Informação disponibilizou as abelhas titânicas, mas Alvin the Chipmunk, personagem criado por intermédio de uma técnica específica de gravação – aceleração da fala humana – continua detendo direitos exclusivos.