INTRO  

O poder no mundo contemporâneo está diluído, fragmentado nas diversas relações humanas, não mais centralizado em certas instituições ou papéis sociais. Na era da informação, todos exercem uma potência de poder sobre o outro e dessa forma se constituem campos de tensões que formam o universo do biopoder e da biopolítica. O cotidiano está mergulhado nesses ruídos e imagens que surgem do choque de diversos interesses e poderes. O trabalho de Fabiano Gonper investiga essas questões, partindo de experiências do cotidiano, pesquisa o indivíduo, como a esfera transitante da dimensão entre o eu individual e o eu coletivo. O desenho passa a ser um campo explorado pelo artista a partir de 1997, quando inicia uma série de trabalhos em espelho e em papel, com registros intimistas que guardam reflexões sobre a condição do seu autor como pessoa, cidadão e artista dentro do sistema de arte.

A pesquisa de Gonper cria na maioria das vezes novas aberturas para se compreender as potencialidades das linguagens (desenho / escultura / pintura), criando embates e situações que fornecem novos elementos poéticos a sua produção. Nos seus trabalhos a imagem não se revela de imediato, ela vai sendo apresentada em diversas temporalidades, a partir do olhar investigador.   Em toda sua obra, o Sujeito está por todo lado. Nesta nova série que integra a exposição, assim como em O Manipulador (2007), o artista redimensiona seu trabalho a partir da saturação visual de imagens cotidianas referenciadas nos meios de comunicação de massa (livros, revistas, catálogos, jornais, fotografias, programas de TV e Internet), em que o deslocamento de imagens entre diversos meios e suportes gera uma nova visualidade, que constitui o campo poético da obra.

Tantas vezes os procedimentos técnicos e suportes (vídeo-projeção, ampliação e redução, impressão) geram a dissolução das imagens. Cenas de situações diversas se entrecruzam e criam protonarrativas contemporâneas. Dos vídeos Gonper extrai frames aleatórios (interstícios), ou mesmo imagens apreendidas pela webcam, diretamente do monitor de seu computador. Independente dos softwares de animação e edição de vídeo, o artista utiliza os sites Youtube e Bambuser para gerar áudio e imagem em plano sequência. A edição e animação dos videodesenhos acontece simultaneamente à gravação, como numa performance. Bonecos em miniatura, imagens estáticas e objetos de seu ateliê, ganham movimento com luzes, sobreposições de áudios e/ou vídeos publicados na rede e, principalmente, pelo próprio píxel que compõe a imagem digital.

A intensidade do contraste entre brancos e pretos trabalhado por Gonper lembra a imagem do filme Renaissance de Christian Volckman (França, 2006), favorecendo uma textura de imagem, na qual a vibração do píxel chega a desenhar expressões sutis em objetos inanimados.   O Gonper Museum – work in progress, legitima essas séries de novos trabalhos realizados, ao passo que alimenta reflexões sobre as relações travadas entre o artista, a instituição arte e o arcabouço museológico; suscita questionamentos sobre os procedimentos museográficos através dos quais os objetos passam a ser historicizados, sacralizados e perpetuados no imaginário social. O artista toma para si as funções de curador, diretor executivo e programador visual, e embaralha estas práticas de poder em negociações com Instituições reais, como museus, centros culturais e galerias, e também em operações de diálogo com outros artistas.  

No seu formato site specifc , o Gonper Museum tem percorrido longo trajeto e algumas de suas exibições adquiriram a função de mostrar obras que não fossem de autoria de Fabiano Gonper, como a que realizou com o trabalho dos artistas Antônio Dias, Cildo Meireles, Iran do Espírito Santo, Lygia Clark, Regina Silveira, Waltércio Caldas, Matias Duville. Já foi exibido em São Paulo (Museu de Arte Moderna), Goiânia, Recife e também Estados Unidos, Argentina e Espanha. Com montagens específicas para abrigar a obra do próprio artista, o Gonper Museum já exibiu as séries Desenhos Secretos (2003), Pinturas Variáveis (2004) e RDS (2010).  

A exposição que entra agora no site BlankTape apresenta trabalhos que lidam com questões como a sociedade e a política (micro/macro), temas que sempre parecem interessarar o artista. A série RDS – Reconfiguração do Sujeito apresenta o universo dos diversos poderes presente na sociedade contemporânea como, na política, na economia, nas diversas relações sociais e meios de comunicação. Com relações espaciais tão híbridas entre os meios e a tipologia do quadro cinematográfico (planos e angulações que auxiliam em estabelecer possíveis vias para novos sentidos), a individualização e o estado de autonomia do sujeito são ampliados.  O exercício dos poderes de ‘todos nós’ – cotidianos, banalizados, centralizados, vigilantes – quando olhados à lupa do artista são dignos de rubor e reflexão inconteste sobre o que está por vir. No conjunto, estes trabalhos formam um corpo plástico e conceitual em que visibilidade e ocultamento revelam-se como problemas capitais.    

 
 
 
 

São Paulo, Brasil | 2010