Videoarte | COR | Sonorizado | 13′ + 13′ + 8′ + 11′ | 2018
Com uso da linguagem documental e da videodança, essa série de videoartes de Paulo Mendel mostra improvisos e coreografias criadas a partir do encontro entre design e dança contemporânea para o projeto Corpo Presente , curadoria de Beta Germano para Galeria Nicoli. Todos os trabalhos foram idealizados sem qualquer recurso cênico além dos próprios efeitos e sons da interação do corpo com o objeto.
Com peças de Rodrigo Almeida, ALVA, Juliana Vasconcellos e Rodrigo Ohtake.
CASULO
Um filme de Paulo Mendel
Design: Rodrigo Almeida
Coreografia: Eduardo Fukushima
Uma rede-parangolé. O objeto escolhido por Rodrigo Almeida e Eduardo Fukushima é naturalmente mais acolhedor. É mutante e protetor. Abriga e dança com o corpo-parceiro de vida e pas de deux. Não à toa, a referência imediata se dá no trabalho de Hélio Oiticica – um apaixonado pelo movimento, pela liberdade e pelo corpo humano. Sobre o Parangolé, Oiticica dizia se tratar da “incorporação do corpo na obra e da obra no corpo”, criando uma “maravilhosa sensação de expansão”. Expansão e nascimento de um indivíduo que explode e eclode! É um casulo potente. Interessados por uma ancestralidade essencialmente brasileira, Almeida e Fukushima criam uma peça-semente que nos leva para um momento de interiorização e compreensão do próprio corpo no espaço cotidiano.
Revelada apenas quando Fukushima se movimenta, a rede Casulo cria suporte para o despertar do inconsciente e da consciência, propondo uma reflexão sobre os agentes provocadores das coisas, as pessoas. A conclusão de Oiticica vale também para a obra aqui apresentada. “A estrutura atinge aí o máximo de ação própria no sentido do ‘ato expressivo’. A ação é a pura manifestação”.
IMENSURÁVEL
Um filme de Paulo Mendel
Design: ALVA
Coreografia: Carol Amares
Basta olhar para Da Vinci, Vitrúvio, Le Corbusier e a turma da Bauhaus, citando apenas alguns, para perceber que o corpo humano foi sempre uma referência fundamental para a elaboração das medidas das coisas, sejam elas móveis, objetos ou máquinas. “Coisas” são criadas para se relacionarem com corpos.
Se o metro sempre foi peça essencial para o trabalho de arquitetos e designers, pareceu importante, então, criar um objeto de medida a partir dos espaços de alongamento, vazios, energias, vetores, movimentações, tensões e articulações de Carolina Amares. Ou seja: todo tipo de medida que se expande – trazendo conforto ou dor – teve, aqui, sua atenção.
A consciência corporal e história particular da bailarina levaria, portanto, o trabalho para além das referências e medidas convencionais. Entre a precisão matemática e a pesquisa psicológica de um hiato abstrato desenvolvido pela percepção humana, o corpo-objeto-dançante ( ele também quebra, vira, cai e se coloca no espaço) de Marcelo Alvarenga e Susana Bastos nasce impregnado de racionalidade e impressionante sensibilidade e dedicação, oscilando entre potência e fragilidade, máximo e mínimo, beleza e conflito.
MIRAGEM
Um filme de Paulo Mendel
Design: Juliana Vasconcellos
Coreografia: Januário
De obras de Diego Velázquez e Jan van Eyck até as instalações de Olafur Eliasson, passando por trabalhos de Michelangelo Pistoletto: o espelho sempre foi objeto de fascínio e estranhamento entre pensadores e criativos.
Ao ver a própria imagem representada nessa superfície mágica, qualquer indivíduo é convidado a pensar sobre uma série de questões: suas possíveis representações, ideias e sentimentos são colocados em jogo. Corpo-físico e corpo-imagem se encontram num momento de suspensão podendo, aqui, confundir, quebrar, transformar e desfigurar o “eu” presente.
Todas estas questões são cravadas em um bloco de mármore – matéria prima significativa quando lembramos dos gregos e romanos, os maiores estudiosos do corpo humano. A pedra nobre e rígida ganha formas, torções e contornos diretamente ligados aos músculos e às estruturas do esqueleto.
Mas, longe de ser apenas uma máquina articulada, o corpo de Januário pulsa e seus gestos parabólicos criam cenas fantásticas emolduradas pelo sangue quente, vital e orgânico quebrando qualquer rigidez da superfície fria chamada vidro. O desvio figural que nasce a partir do Corpo Presente leva a discussão física ao patamar psicológico, criando imagens sedutoramente surreais. Como um sonho contemporâneo de Dali.
TORSO
Um filme de Paulo Mendel
Design: Rodrigo Ohtake
Coreografia: Danielli Mendes
Corpos são diariamente organizados e transformados por móveis e arquiteturas. É intrigante notar que, por um lado, temos a dança moderna libertando o corpo da rigidez do balé clássico (aqui ele deve se adaptar à forma, sem negociações), enquanto, por outro, parece que nos tornamos escravos do próprio mundo que criamos. E os danos são impressos diariamente por meio de gestos, posturas e reações aos estímulos causados pelos móveis que nos cercam e vícios que nos assombram.
Se a proposta de muitos coreógrafos contemporâneos é esmiuçar a noção de gestos do cotidiano levando-os ao palco, provocamos aqui uma reflexão sobre estes movimentos sem deslocamento: como o corpo age e reage diante das linhas e forças do mobiliário? Como ele elimina ou potencializa um movimento ou atitude?
O corpo-ativado de cada bailarino, quando repensa sua relação com os objetos a nossa volta, grifa diferentes problemáticas. Nós, vetores, medidas e espaços. Apoio, gravidade, fluidez e equilíbrio. São corpos vivos, flexíveis, mutantes e com limites. Foram eles que aqui ditaram as regras para o nascimento de novos móveis…com alma, com corpos presentes.